Ao trabalharmos com blockchain, tendemos a ver a estrutura como uma rede onde se conectam players. Esses players transacionam entre si e, em tese, quanto mais participantes adotam uma moeda, maior seu valor social. Se apenas uma pessoa usa um meio de pagamento, com quem ela irá transacionar? Já com uma comunidade de participantes, a rede possui maiores potencialidades.

Esse argumento, se aplicado diretamente, gera a famosa lei de Metcalfe: o valor de uma rede é dado pelo quadrado do número de participantes. Apesar de acreditar que falta respaldo empírico para a lei e ter um artigo acadêmico sugerindo sua não validade para o , também acredito que a intuição das redes é forte. Na economia chamamos esse elemento de externalidade de redes. Ela não ocorre apenas em meios de pagamento, mas também para, por exemplo, sites como o Facebook. Quanto mais usuários, mais conteúdo que possivelmente alguém desejará ver.

Uma aplicação pouco intuitiva desse conceito se dá nos mercados financeiros e bancário. No mercado financeiro, além da imediata troca de ativos, há também questões como liquidez e assimetrias de informação causando contágios. No mercado bancário, tema desse artigo, além desses dois outros fatores, há também a ideia de que bancos sâo players grandes e com algum poder no seu mercado. Eles podem se recusar a adotar uma determinada tecnologia e fazer escolhas tecnológicas que determinam o formato do mercado.

Quando a blockchain surgiu, ela foi desenhada como uma ameaça aos bancos: troca de recursos descentralizada. Bancos são uma forma de armazenar e realizar pagamentos centralizando a estrutura. Num contexto de blockchains escaláveis e amigáveis, talvez não fosse necessário bancos. Nesse caso, não há grandes sentidos de desenvolver uma tecnologia que pode vir a ser uma ameaça para seu modelo de negócios. Além do mais, os ledgers distribuídos como a blockchain, em seus dez anos, não mostraram ainda um uso compatível com, por exemplo, as transações da Visa. Por todos os aspectos, o uso de uma blockchain similar ao Bitcoin é algo difícil, apesar de sua alta confiabilidade tecnológica e do atual sistema bancário ser bem defasado.

A ofereceu uma interessante ferramenta. A companhia percebeu que bastavam seleção criteriosa de quem participa da rede e o consenso clássico – sem necessidades de proof-of-work ou outras garantias – para sistemas de pagamentos fechados funcionarem e a rede performaria melhor que o atual sistema. Dessa forma, bancos podem controlar a entrada na sua rede bancária, como atualmente, e transacionar de maneira mais rápida. A força dos bancos seria usada para manter a rede atual entre eles, sem dar margem para uma estrutura descentralizada se concretizar. Os riscos tecnológicos de uma blockchain experimental e os riscos sociais de desenvolver essa tecnologia seria minimizada. Podemos ver essa questão no fato de, apesar do JP Morgan ter sua solução interna baseada na , ainda haver parcerias fortes com a Ripple em diversas outras instituições financeiras.

Todo esse poder de escolha sobre como se adaptar tecnologicamente passa por algo simples: pessoas gostam de alguma facilidade. Atualmente, o hábito de usar bancos é naturalizado e fácil. Com as inovações financeiras recentes como bancos digitais, internet banking, contas que remuneram de acordo com a taxa de juros e muitos outros, ficou mais vantajoso pertencer a esse sistema. Ripple, ou uma solução interna, como a Quorum do JP Morgan, podem vir a ser uma dessas vantagens, garantindo redução de custos dos bancos, maior velocidade e menor poder de blockchains em desmobilizar o mercado bancário. Com a vantagem de já serem players importantes, os bancos possuem poder de se modernizar em outra direção e com isso desmobilizar algum potencial das criptomoedas baseadas em mineração se consolidarem.

De certa maneira, o sucesso da Ripple ou algum similar – em particular as soluções como as anunciadas ontem numa conferência de bancos americana pelo JP Morgan – podem vir a ser uma ameaça para as blockchains públicas como meios de pagamento a menos que essas consigam exercer menores taxas ou que a privacidade venha a ser uma necessidade (nesse caso valorizando , ZCash e outras privacy coins). As duas maiores criptomoedas atualmente não são parte do mesmo ecossistema, são modelos de negócio diferentes e diametralmente opostos. É bem possível que ambas sobrevivam, mas não é provável que se um modelo der muito certo como meio de pagamento, o outro continue no mesmo mercado.

Por fim, creio que os bancos de uma perspectiva estratégica parecem ter tomado uma decisão que maximiza seus retornos e minimiza seu risco. Evidentemente, um player como a Ripple não está garantido: talvez seja melhor para os bancos não contar com um intermediário, cabendo estudo para detectar isso. Da perspectiva do investidor de criptoativo, vale notar que a XRP é um pouco alheia a esse processo da Ripple, servindo mais como um numerário atualmente na rede. Deve-se observar com cuidado as movimentações do setor bancário, portanto. Apesar de alguns fãs de criptoativos serem bem contrários a tecnologias mais centralizadas como a Ripple, a centralização é a natureza de bancos e outros grandes players que contam com redes humanas maiores que as blockchains e irão reagir.

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